Pesquisa propõe metodologia inovadora que aproxima a ciência do cotidiano das comunidades mais afetadas pelas mudanças do clima
Como podemos tornar os planos de enfrentamento às mudanças climáticas mais próximos da realidade vivida pelas comunidades? Essa foi a pergunta que guiou uma pesquisa desenvolvida no Instituto de Geociências da UFBA, que propôs uma nova leitura sobre os riscos climáticos na cidade de Salvador, a partir de uma metodologia chamada “Cadeia de Impactos Climáticos”.
A proposta vai além das estatísticas. Ela busca escutar diretamente quem vive nas áreas mais vulneráveis, como encostas e regiões alagadiças, afetadas pelas chuvas intensas, inundações e deslizamentos. O estudo, conduzido por estudantes e pesquisadores do Grupo COLAPSO, montou uma cadeia de impactos com base em oficinas participativas, em que os próprios moradores indicaram os principais riscos enfrentados no dia a dia.
A metodologia combina dados qualitativos e quantitativos, ou seja, cruza números com percepções e experiências concretas. Assim, ela se torna uma ferramenta poderosa para planejar políticas públicas mais eficazes e justas. Ao contrário do que costuma ocorrer nos documentos técnicos elaborados por especialistas externos, como os do Plano Municipal de Adaptação e Mitigação às Mudanças Climáticas (PMAMC), a abordagem do grupo da UFBA revelou aspectos invisíveis para quem não vive nesses territórios.
Um dos pontos centrais da pesquisa foi mostrar que o risco não está apenas nos eventos extremos — como chuvas fortes —, mas também na vulnerabilidade social das populações expostas. Renda, moradia precária e ausência de apoio do Estado são elementos que, combinados, tornam uma simples chuva um episódio de grande impacto.
Além disso, os participantes identificaram que a falta de recursos financeiros e o abandono das políticas públicas fazem com que a ameaça climática seja constante. A cadeia construída por eles trouxe um retrato direto: o risco é real, cotidiano, e afeta mais quem tem menos.
Mesmo com uma estrutura mais simples que a versão oficial do PMAMC, a cadeia elaborada nas oficinas apresentou grande coerência com a realidade local. Ela permite pensar planos de risco adaptados à lógica de cada bairro, colocando a experiência vivida no centro das decisões. Segundo os autores, isso é essencial para romper com o ciclo de políticas distantes e tecnocráticas, e abrir espaço para uma gestão climática mais democrática.
O estudo também faz um alerta: sem envolvimento das comunidades na produção dos diagnósticos e das soluções o combate aos efeitos do clima pode se tornar mais uma ferramenta de exclusão, disfarçada de política pública.
Com a metodologia das Cadeias de Impacto Climático, o desafio passa a ser transformar a escuta das populações vulneráveis em ação concreta. Afinal, entender o risco é o primeiro passo para construir cidades mais seguras, justas e preparadas para o futuro.
Para saber mais consulte o artigo publicado por Leandro Gois Santos na revista Humboldt pelo link: https://www.e-publicacoes.uerj.br/humboldt/article/view/74715