Na Geografia dos Solos, poucas palavras são tão utilizadas e tão mal compreendidas, quanto “topossequência“. Ao longo das décadas, esse termo foi aplicado a diferentes escalas e finalidades, mas nem sempre com precisão. Afinal, o que é (ou deveria ser) uma topossequência?
No artigo publicado na Revista Brasileira de Ciência do Solo, pesquisadores de três universidades brasileiras, sob liderança de Grace B. Alves, analisam criticamente o uso do termo com base em mais de mil publicações científicas. A partir dessa análise, o grupo propõe significado original de topossequência e adotar critérios mais consistentes para sua aplicação.
Três abordagens distintas para o mesmo termo
O trabalho identifica três principais formas de uso do termo “topossequência”:
1. Superfícies geomórficas (escala regional): usadas para representar a distribuição espacial de classes de solo associadas a unidades de relevo amplas. Embora valiosas para levantamentos exploratórios, essa abordagem não represnta uma topossequência no sentido genético e processual do termo.
2. Catena: refere-se a perfis de solo em diferentes posições da encosta, analisados de forma descontínua e com foco taxonômico. Nesse caso, os solos aparecem como elementos independentes, e não como parte de um sistema evolutivo.
3. Topossequência (no sentido estrito): nessa abordagem, o solo é concebido como uma cobertura contínua, em que os horizontes se transformam lateralmente ao longo da vertente. Assim, essa transformação resulta da influência da topografia e dos fluxos de água, o que revela uma dinâmica de coevolução entre solo e relevo.
Representação gráfica das principais abordagens de estudo da variação espacial dos solos
Ao distinguir esses conceitos, o artigo propõe uma taxonomia mais rigorosa: usar “catena” quando o foco for taxonômico e descontínuo, “superfície geomórfica” quando o recorte for regional, e reservar “topossequência” para quando a análise considerar a continuidade lateral dos processos pedogenéticos.
Por que isso importa?
A falta de clareza conceitual afeta a qualidade metodológica dos estudos e dificulta a comparação entre resultados. Quando o conceito é bem definido, os pesquisadores podem construir conhecimento acumulativo e formular linhas de pesquisa coerentes.
Além disso, o artigo propõe uma taxonomia mais rigorosa:
– Usar “catena” para sequências taxonômicas descontínuas;
– Empregar “superfície geomórfica” quando o enfoque for regional;
– Reservar “topossequência” apenas para análises da cobertura pedológica em continuidade lateral.
Caminhos para novas pesquisas
Com base nessa revisão, o artigo sugere direções promissoras para a pedologia e a geomorfologia. Entre elas, destacam-se quatro frentes principais:
– A análise estrutural da cobertura pedológica
– A reconstrução da evolução de paisagens tropicais
– A modelagem numérica de vertentes
– E o uso de geoindicadores em processos pedogenéticos
Portanto, trata-se de uma agenda fértil para múltiplas publicações interligadas, capaz de ampliar a visibilidade de pesquisadores atuantes na interface solo-relevo.
📖 Leia o artigo completo: https://doi.org/10.36783/18069657rbcs20230137
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Referência:
Alves GB, Oliveira FS, Silva AHN, Souza Junior VS. Toposequence: What are we talking about? Rev Bras Cienc Solo. 2024;48:e0230137. https://doi.org/10.36783/18069657rbcs20230137